terça-feira, janeiro 23, 2007

v/a . 4 women no cry [cd monika enterprise, 2006]

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Após o sucesso do primeiro volume, editado em 2005, a Monika Enterprise escolhe mais quatro criadoras para prosseguir a sua propaganda feminista. Dorit Chrysler, austríaca radicada em Nova Iorque, é colaboradora habitual de bandas como os Mercury Rev, os Dinosaur Jr. ou Elliot Sharp. Toca theremin e, em cinco faixas, avança por terrenos da pop electrónica neo-psicadélica, não muito longe daquilo que fazem bandas com os Broadcast ou os Pram. “My Sweet Chimera” marca pontos - diálogo entre a flauta, a harpa e o theremin, particularmente emotivo e cinemático. Mico é Mieko Shimizu, nascida no Japão e residente em Londres. Habitual colaboradora de diversos artistas plásticos, produziu bandas sonoras para cinema manga, gravou com os Coldcut e com Robert Lippok (dos To Rococo Rot) e mantém um projecto de drum’n’bass mutante e um outro mais experimental em conjunto com a violinista Aska Kaneko. “After Rain” e “Fruit Tree” soam àquilo que seria um improvável encontro entre Burial e os Portishead, o que, parecendo que não, é um elogio. Quase dez anos depois, o trip-hop surge contaminado pelo dubstep, sobrevive e recomenda-se. Monotekktoni é uma das artistas mais importantes da cena musical underground de Berlin. Colaboradora dos recomendáveis Modeselektor e de Kevin Blechdom, cria alguns dos momentos mais intensos desta compilação. Fala-se em electro-minimalismo neurótico: algo que como conceito é capaz de assustar qualquer um, mas que, na prática, se assemelha a um ataque de malária em plena noite da consoada. É bom, sim. É. Finalmente, Íris representa a vibrante cidade de Barcelona. A menos conhecida das quatro, estuda arte electrónica e desenho digital, actuou no último Sonar e é uma espécie de PJ Harvey a cantar sobre um computador infectado pelo pior dos vírus electrónicos. Miraculosamente, escapa ao descalabro. Venha o próximo volume. Rápido.

(texto publicado originalmente no # 6 do jornal UM)

domingo, janeiro 21, 2007

donnacha costello . 6X6=36 [cd minimise, 2006]

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Depois dos dez máxis da colecção Color Series, o irlandês Donnacha Costello mantém a sua aposta em edições conceptuais. 6X6=36, para além da lição de aritmética, inclui, num único álbum vendido a preço reduzido, os três máxis mais recentes editados este ano. Gravadas em seis dias, com Donnacha literalmente enfiado no seu estúdio em Dublin, e editadas num intervalo de seis semanas, as seis faixas têm em comum o facto de durarem, cada uma, seis minutos exactos, nem que para isso tenham que terminar de forma abrupta. À primeira vista parece uma manobra de marketing, um truque utilizado para capturar a atenção numa altura em que todas as semanas aparecem demasiadas edições dentro do género. Mas, no fundo, o importante é a música: Donnacha é um esteta do minimalismo mais absoluto, um mago dos bleeps e dos bloops mantidos sob ritmo elevado, revelado imediatamente nos primeiros instantes de cada tema e repetido com precisão matemática até atingir um estado próximo da hipnose. “Punishment” e “Exhaustion” são envolventes e circulares como um gato atrás da própria cauda, “Repetition” assemelha-se a um jogo de ténis de mesa infinitamente empatado entre a linha de baixo e o ácido dos sintetizadores, “Persistance” e “Claustrophobia” transbordam confiança e personalidade e “Panic” é tão minimal, tão minimal, que quase nem se ouve. 6X6=36 não será um dos discos mais importantes do ano mas coloca Donnacha na lista dos nomes a seguir com atenção dentro daquela fracção da música electrónica situada algures entre a pista e as galerias de arte, a experimentação e a melodia, a técnica e as emoções.

(texto publicado originalmente no # 6 do jornal UM)

sábado, janeiro 20, 2007

kango's stein massiv . ting Æ like te mat [12" my best friend, 2005]

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kango's stein massiv tornou-se (mais) conhecido com "lettbeint liten sak" de 2006 mas já havia vida antes disso. entre as suas edições na trailerpark e o êxito ... hum ... massivo de 2006 encontrei "eddik": um sample de algo parecido com o "apache" dos incredible bongo band, uma linha de baixo disco incrível e um kick de energia inesgotável. com dois anos de atraso encontrei a luz.

sexta-feira, janeiro 19, 2007

john tejada . cleaning sounds is a filthy business [2xlp palette recordings, 2006]

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John Tejada vive em Los Angeles – provavelmente um dos locais mais improváveis do mundo para produzir música electrónica. Originário de Viena, Tejada actua entre os Estados Unidos, a Europa e o Japão, país onde mantém um considerável número de fãs. Sendo um dos mais prolíficos produtores e remisturadores da actualidade, gere ainda uma editora – a Pallete Recordings – com um catálogo aproximado das 50 edições, distribuído entre álbuns e máxis. Como produtor, Tejada não se restringe a um determinado género; move-se essencialmente pelo house e pelo tecno minimal, vai ao drum’n’bass e à electrónica mais abstracta e ainda tem tempo para, em conjunto com Takeshi Nishimoto, assinar como I’m Not A Gun e aproximar-se, sem medos, dos terrenos movediços do post-rock.
“Cleaning Sounds…” é um disco inspirado na primeira vaga do tecno de Detroit e na sonoridade produzida pelos pioneiros da década de 80. Álbum reconhecidamente nostálgico – é o próprio autor que admite em diversas entrevistas que tentou capturar a energia, a excitação e o fascínio do tempo em que começou a gravar música de dança –, é um desses raros, e por isso mesmo inesperados, momentos em que a tentação para intelectualizar permanece ausente. Directo para a pista, funcional sem ser redundante, “Cleaning Sounds…” oferece futuro clássico atrás de futuro clássico, imediatamente antes de um novo clássico. O resultado não vai salvar o mundo mas faixas como “Paper Jet”, “Mutation”, “What Happened to Manners?” ou “The Zone” confirmam um disco que está muito para além da simples competência e se junta a “The Conservation Of Electric Charge”, de Bodycode, e a “Flora & Fauna”, de Dominik Eulberg, na lista reservada ao tecno minimal com fundamentos orgânicos ou algo assim no género. Essencial.

(texto publicado originalmente no # 5 do jornal UM)

domingo, janeiro 14, 2007

portable . speak out [12" süd electronic, 2006]

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ainda 2006...
portable também é bodycode e aqui é completamente bodycode.
techno explicito com voz, metade robot metade bowie.
duas faixas que antecipam o álbum previsto para este ano.
óptimo.

terça-feira, janeiro 09, 2007

robert henke . layering buddha [cd imbalance, 2006]

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Está uma bonita noite para ficar em casa.
Maquineta simples concebida pela dupla chinesa FM3, a Buddha Machine contém nove breves loops pré-gravados, que devem ser tocados de forma aleatória e que não podem ser alterados pelo utilizador. Símbolo de uma certa sofisticação estética, onde mais do que o conteúdo interessa a forma, transformou-se rapidamente num objecto de culto, capaz de substituir meia dúzia de discos de electrónica ambiental ou, numa perspectiva mais prosaica, os espanta-espíritos. Robert Henke, também conhecido como Monolake de cada vez que dá livre curso ao seu instinto rítmico, contribui para o perpetuar desta história. Henke explorou as potencialidades da máquina – um simples transístor de produção barata, com um som low-fi equivalente ao dos primeiros jogos de computador - manteve o groove em suspenso, sobrepôs sons e desenvolveu dez faixas, divididas em camadas e baseadas em cada um dos loops da Buddha. O trabalho final é a materialização sentimental de uma caixa que não mudou o mundo mas ajudou a alterar a percepção que temos dele. “Layering Buddha” é um disco fantasmagórico e denso, um longo drone glacial diversas vezes perturbador – a faixa nove é das melhores coisas que podemos ouvir este ano – e uma moldura minimalista de electrónica ambiental que funciona melhor à medida que avançam as longas e solitárias horas da madrugada. No final reparamos que a Buddha Machine era apenas um pretexto. No seu interior está o objectivo primordial, um prenúncio para a descaracterização e morte lenta do artista, enclausurado dentro de uma caixa de música eterna.

(texto publicado originalmente no # 5 do jornal UM)

sábado, janeiro 06, 2007

Minimal maximizado

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Audion é o pseudónimo do texano Matthew Dear. Se os discos em nome próprio são a vertente user-friendly e familiar de Dear, Audion é o seu alter-ego insolente e provocador. “Suckfish” – o primeiro álbum que incluía os máxis editados até então – foi um sucesso irresistível, um fantasma do fantasma do tecno e do acid, com títulos como “Just Fucking”, “Titty Fuck” e “Your Place Or Mine” capazes de colocar a pista de dança na mais completa desordem. “Mouth to Mouth” é a continuação aguardada há muito depois de “Just A Man / Just a Woman”, disco dividido a meias com Ellen Allien e experiência relativamente falhada. Música definida algures como “a digital chainsaw melting over a 4/4 pulse”, corresponde exactamente a essa descrição no lado A, com picos distribuídos de forma estratégica por toda a extensão da faixa que sugerem ao ouvinte um estado de euforia controlada, como um vulto espectral a mover-se nas sombras da claridade turva que precede o início do dia. No lado B, “Hot Air” é o complemento natural para o entusiasmo entretanto gerado, com um ritmo circular incorporado sobre um gancho de baixo eficaz, repetido e acelerado de forma sistemática. Audion gere as expectativas criadas nas horas de maior tráfego das pistas de dança de forma simples e eficiente.

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O novo máxi do chileno Ricardo Villalobos está nos antípodas de “Mouth To Mouth”. Cerebral – talvez demasiado – arrisca um manifesto de minimalismo quase paralisante, que eleva a noção de repetição ao extremo e conduz o ouvinte a uma reacção emocional extraordinária, algures entre a estupefacção e o deslumbramento. Dividido em duas partes por questões de espaço físico do vinil, porque na verdade é tudo uma faixa só, "Fizheuer Zieheuer" é a arma secreta e misteriosa com que Ricardo terminava os sets no Verão passado e surge agora finalmente identificada e disponível em disco. A fórmula não anda muito longe da remistura que Ricardo fez para “Electrolatino” de Señor Coconut, com a secção de metais a aparecer de forma inesperada, como se surgisse de uma outra faixa, para de repente passar a assumir o papel principal. A essência do tema resume-se a trinta segundos que se desenvolvem por volta do quinto minuto – o que poderia indiciar que o resto do tempo seria simplesmente decorativo – mas que sempre lá estiveram. Paradoxalmente, esses momentos preciosos não poderiam existir da mesma forma sem esse frágil equilíbrio anterior e o desenlace posterior que conduz ao clímax que, sabemos vinte minutos depois, nunca há-de surgir. Alguém falou em "Fizheuer Zieheuer" como a faixa mais hipnótica de sempre a aparecer numa pista de dança e é capaz de ter razão. Villalobos termina 2006 da mesma forma que “Sieso” terminou 2005: com o melhor tema do ano.

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Isolée é o alemão Rajko Muller, tipo veterano e já careca que no ano passado editou “We Are Monster”, híbrido electro, tecno-house, minimal, capaz de convencer os putos indies de que a música electrónica de dança poderia ser mais do que simples divertimento. Para esses, arrisco eu, “Hermelin” sabe a desilusão. Para todos os outros também. Acima de tudo por causa de “Sleazy Bee” – faixa em que Muller se aventura no electro sintetizado típico do início da década de oitenta, mas onde, por uma vez, lhe falta o golpe de asa capaz de produzir ouro a partir da poeira cósmica. No lado A, “Hermelin” revela um produtor em estado de graça, com as cordas sintetizadas a seguirem, imperturbáveis, o seu rumo entre a energia bruta da batida. Sobra “Willy Skipper”, Isolée vintage a jogar às escondidas com as potencialidades da tecnologia até finalmente aparecer o beat que traz o ouvinte de regresso à terra. O resultado final revela duas faixas sublimes, capazes de justificar o preço do disco, e uma outra claramente a descair para o lado errado da música funcional e decorativa.

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Jean Patrice Rémillard, dono da editora Archipel e um dos pioneiros da cena tecno minimal de Montreal, é Pheek. A Archipel é uma das editoras mais interessantes do momento, muito por causa de “Between Heartbeats” de Jesse Somfay, disco que simboliza o equilíbrio frágil entre introspecção melancólica e a vertigem da pista de dança e obra capaz de devolver as emoções a um género de música muitas vezes acusado de ser demasiado frio e impessoal. "Lignes et Directions" evita a cristalização estética que se começa a pressentir em editoras como a Minus e a Traum e é a antecipação para “En Légère Suspension”, novo álbum de Pheek que deverá sair ainda este ano. Aqui o ritmo está no sítio certo e o groove é meticulosamente construído de forma paciente. Pheek transforma um conjunto de estruturas complexas num efeito global próximo da euforia, com um sorriso tranquilo nos lábios e as palmas das mãos voltadas para cima. Tudo aqui é funk, contagiante; numa palavra, óptimo.

(texto publicado originalmente no # 4 do jornal UM)