kode9 and spaceape . memories of the future [hyperdub, 2006]
Dub digital e histórias de alienação e violência urbana convergem num dos discos mais esperados do ano.
A vida corre bem a Kode 9, DJ, produtor, dono da editora Hyperdub, apresentador do programa Forward numa das rádios piratas mais ouvidas de Londres, professor universitário e um dos ideólogos com discurso mais coerente do universo dubstep. Já este ano foi lançado pela sua editora o disco de Burial, um dos álbuns mais falados dos últimos meses e que irá certamente ocupar um espaço importante nas listas de final de ano. Agora é a vez de Kode 9 e do seu vocalista residente, Spaceape, tomarem o centro das atenções com o álbum de estreia, “Memories of The Future”.
Dizem os entendidos que o misterioso não é nada de novo mas sim algo já conhecido que regressa sob uma forma diferente. Em certa medida é isso que se passa em “Memories Of The Future”, um álbum notável na forma como Kode 9 preenche os espaços entre as batidas, e na maneira obstinada como Spaceape constrói uma atmosfera de pós-apocalipse, simultaneamente urbana, fantasmagórica e primordial. Mas como estética nada daqui será propriamente novo - ok, temos um tipo a discursar sobre o caos e uma espécie de dub mutante com baixos sobrecarregados e batidas digitais - e vêm-nos à memória discos como “Maxinquaye” de Tricky, Adrian Sherwood, as produções da U Sound e uma coisa estranhíssima chamada “Millions of Images” com William S. Burroughs a dissertar sobre drogas numa música de Gus Van Sant.
É, no entanto, um grower, um disco que apesar de cansativo e, numa primeira análise, repetitivo, cresce com as audições, com o tempo e com pré-disposição para o assunto. Será “Memories of The Future” o ponto de convergência entre Linton Kwesi Johnson e as novelas de J.G. Ballard rumo ao espaço inter-galáctico, como escreveu Simon Reynolds no seu blog? É provável que não, mas dificilmente ouviremos subgraves tão intensos nos próximos tempos.
(texto publicado originalmente no # 1 do jornal UM)
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