terça-feira, agosto 03, 2004

Blue Skied An' Clear (Morr, 2002)



No final da década de oitenta um estilo de música etéreo e melancólico surge na ressaca do relativo sucesso da editora 4AD e daquilo que grupos como os Cocteau Twins ou os This Mortal Coil fizeram nos anos anteriores. Baptizado como dream pop ou, mais prosaicamente, como movimento shoegazer, grupos britânicos como os Curve, Lush, Moose, Ride ou os Slowdive misturam uma carga melódica – simultaneamente sensual e sombria – devedora dos primeiros álbuns dos Cocteau Twins com o turbilhão hipnótico que saía das guitarras distorcidas dos norte-americanos My Bloody Valentine por alturas da edição do seu disco de estreia. Mas após a euforia inicial, a Creation (editora fundamental neste contexto) entra em falência, a imprensa inglesa rapidamente descobre o grunge, inventa o fenómeno brit-pop e o movimento desapareceu quase sem deixar rasto. Até que, mais de dez anos passados, as sementes deixadas pelos shoegazers foram encontradas por um conjunto de músicos ligados à electrónica, com vontade de reutilizar as texturas harmoniosas e melódicas da dream pop como matéria para humanizar os laptops, derreter o gelo inerte dos ritmos sintéticos e recuperar o sentimento ingénuo da geração pré-chill out. Sediada em Berlim, a editora Morr convidou alguns dos mais representativos membros do seu catálogo – Isan, Limp, Manual, Lali Puna ou os Komëit - e alguns artistas próximos - como os Múm, Future 3 ou B.Fleischmann - para participar num disco de homenagem aos Slowdive. Não sendo apenas um disco de reinterpretações mais ou menos nostálgicas de temas alheios, 'Blue Skied and Clear' é igualmente um disco onde se faz um verdadeiro tributo ao espírito tristonho e contemplativo dos anos 80. Dividido entre um primeiro disco com versões para as músicas dos Slowdive e um segundo disco com músicas inspiradas pela música dos britânicos, 'Blue Skied and Clear' configura-se com uma excelente companhia para dias de chuva fora de época, como o de hoje. Mesmo considerando a hiper-valorização característica de quase toda a música produzida em finais dos anos 80/início da década seguinte e o rápido esgotamento criativo da indietrónica - presa em lugares comuns e tiques repetitivos - seria certamente lamentável ignorar uma das compilações mais consistente surgidas nos últimos anos.

nota: ouvir igualmente o anterior 'Putting The Morr Back In Morrissey'.